A redução da base de cálculo do ICMS através dos convênios do Confaz: solução ou armadilha?


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Projetado pelo FreepikPor Paulo Henrique da Silva Vitor*

Como de conhecimento comum, devido à elevada alíquota de ICMS sobre os serviços de telecomunicações e, ao mesmo tempo, devido ao limitado creditamento de ICMS proporcionado às empresas de telecomunicações, a carga tributária de tais empresas, fora do Simples Nacional, pode se mostrar extremamente elevada.

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Sendo que, para evitar a “morte súbita” com a exclusão do Simples Nacional, é fundamental um planejamento tributário bem executado, aproveitando-se os melhor dos enquadramentos tributários existentes.

Nesta toada, com a perspectiva de “auxiliar” as empresas que ultrapassaram o limite doSi mples Nacional (R$ 4.800.000,00/ano), ou ultrapassaram o sublimite inerente ao ICMS e ISSQN no Simples Nacional (R$ 3.600.000,00/ano), nos últimos meses, surgiram no Brasil alguns Convênios editados pelo CONFAZ, com a redução escalonada da base de cálculo do ICMS, de acordo com o valor da receita bruta acumulada nos últimos 12 (doze) meses.

O primeiro Convênio do CONFAZ publicado neste sentido, foi o Convênio ICMS nº 03, de Janeiro de 2017, que autorizou o Estado de Santa Catarina a proceder com a redução da base de cálculo do ICMS incidente sobre as prestações internas de serviços de telecomunicações, nas seguintes condições:

Cláusula segunda Às empresas incluídas no Programa poderá ser concedida a redução de base de cálculo do ICMS incidente nas prestações internas de serviços de telecomunicações a consumidor final localizado no território de Santa Catarina, de forma que a carga tributária seja equivalente a:

I – 10% (dez por cento), para empresas cuja receita bruta acumulada nos 12 meses anteriores ao pedido de concessão do benefício seja de até R$ 6 milhões;

II – 12% (doze por cento), para empresas cuja receita bruta acumulada nos 12 meses anteriores ao pedido de concessão do benefício seja superior a R$ 6 milhões e até R$ 9 milhões;

III – 17% (dezessete por cento), para empresas cuja receita bruta acumulada nos 12 meses anteriores ao pedido de concessão do benefício seja superior a R$ 9 milhões e até R$ 12 milhões.

Posteriormente, foi publicado o Convênio ICMS nº 19, de Abril de 2018, que autorizou o Estado do Ceará a reduzir a base de cálculo do ICMS nas prestações internas de serviços de comunicação, em 75% (setenta e cinco por cento). Sendo que, em Julho de 2018, foram incluídos nos termos deste Convênio os Estados de Pernambuco e Piauí.

Por fim, foi publicado o Convênio ICMS nº 90, de Setembro de 2018, que autorizou o Estado do Mato Grosso a conceder redução de base de cálculo nas prestações de serviços de comunicação multimídia, em condições semelhantes àquelas definidas por força do Convênio ICMS nº 03/2017 (Santa Catarina), mas com um diferencial importante: o Convênio ICMS nº 90/2018 abarca não apenas as empresas imediatamente egressas do Simples Nacional.

Todos os referidos Convênios possuem regras para a efetiva percepção dos benefícios neles estipulados. Exemplificando, o Convênio aplicável aos Estados do Ceará, Pernambuco e Piauí exige o preenchimento das seguintes condições: (i) esteja enquadrado na CNAE principal sob o nº 6110-8/03 (SCM) ou 6110-8/01 (STFC) ou 6141-8/00 (TV por Assinatura); (ii) esteja enquadrado como prestadora de pequeno porte; (iii) possua sede no Estado concedente; (iv) comprove geração de empregos diretos no Estado concedente.

Com a ressalva de que, neste Convênio específico (Convênio ICMS nº 19/2018), existe previsão expressa que admite a possibilidade da regulamentação de cada Estado inserir outras regras e condições para a efetiva percepção do benefício.

Enquanto que o Convênio aplicável ao Estado de Santa Catarina (com regras muito similares àquele aplicável ao Estado do Mato Grosso), exige o preenchimento das seguintes condições: (i) comprovação da correta tributação dos serviços de telecomunicações prestados; (ii) desistência de qualquer discussão, administrativa ou judicial, relativa a incidência de ICMS sobre a prestação de serviços de telecomunicações, especialmente quanto à internet banda larga e VOIP; (iii) contratação de links de internet de estabelecimentos devidamente inscritos no CCICMS/SC e com Ponto de Presença no território catarinense; (iv) emissão de documentos fiscais de acordo com o Convênio ICMS 115/03, de 12 de dezembro de 2003.

Outras regras são dispostas nos referidos Convênios ICMS nº 03/2017 e 90/2018, inclusive regras atinentes às hipóteses de exclusão dos Contribuintes dos mencionados Convênios, motivo pelo qual se recomenda uma leitura acurada dos mesmos.

À primeira vista, considerando a redução da base de cálculo do ICMS (redução que pode chegar a 75%, como no caso do Convênio aplicável aos Estados do Ceará, Pernambuco e Piauí), estes Convênios se mostram extremamente atrativos às operadoras de telecomunicações.

Todavia, recomenda-se muita cautela na efetiva opção por estes Convênios, pois, como veremos, podem representar uma verdadeira “armadilha” do Fisco.

Tratando-se primeiramente dos Convênios aplicáveis ao Estado de Santa Catarina (Convênio ICMS nº 03/2017) e ao Estado do Mato Grosso (Convênio ICMS nº 90/2018), nota-se que a adoção deste Convênio representará, necessariamente, na impossibilidade de se realizar qualquer separação de serviços quando do faturamento aos clientes/assinantes, seja separação entre SCM x Conexão à Internet (SVA), seja separação entre SCM x locação.

Isto porque, além dos referidos convênios exigirem a celebração de regime especial, os mesmos condicionam expressamente a concessão do benefício à “correta tributação dos serviços de telecomunicações prestados”, bem como à “desistência de qualquer discussão, administrativa ou judicial, relativa a incidência de ICMS sobre a prestação de serviços de telecomunicações, especialmente quanto à internet banda larga e VOIP”.

O que significa dizer que, para aderir a este convênio, os serviços de internet banda larga e VOIP devem ser tratados integralmente como telecomunicações.

E no tocante ao Convênio aplicável aos Estados do Ceará, Pernambuco e Piauí (Convênio ICMS nº 19/2018), apesar deste Convênio ser extremamente sucinto, como já colocado anteriormente, foi estabelecida a possibilidade da regulamentação de cada Estado apresentar outras regras e condições à efetiva percepção do benefício.

E exatamente neste sentido, tomando-se como exemplo a regulamentação já implementada pelo Estado do Ceará (RICMS/CE), nota que o Estado do Ceará também está condicionando a concessão deste benefício à celebração prévia de um regime especial, bem como exige que o contribuinte que pleitear o regime especial “esteja regular quanto ao recolhimento do ICMS e obrigações tributárias acessórias previstas na legislação”.

Sendo que a redação empregada pelo Estado do Ceará, em nossa visão, possui também viés extremamente subjetivo, deixando a critério do próprio Estado do Ceará a interpretação do que o mesmo considera como “regular”, seja no que se refere a obrigação principal (recolhimento do ICMS), seja no que se refere às obrigações acessórias.

Com isso, para admitir as empresas no regime especial (e autorizar a efetiva percepção da redução de base de cálculo), há grande possibilidade destes Estados impedirem também qualquer separação de serviços quando do faturamento aos clientes/assinantes, seja separação entre SCM x Conexão à Internet (SVA), seja separação entre SCM x locação. Ou seja, a tendência é que os Estados do Ceará, Pernambuco e Piauí também determinem que os serviços de internet banda larga e VOIP sejam tratados integralmente como telecomunicações.

Portanto, além das outras consequências já naturalmente decorrentes da adoção destes Convênios (como a vedação ou limitação ao creditamento do ICMS), é fundamental que as operadoras de telecomunicações, ao cogitarem a percepção destes benefícios, também considerem a impossibilidade de manter qualquer separação dos serviços.

E também, é fundamental considerar que estes benefícios não foram estabelecidos por Lei, mas sim autorizados por Convênios do CONFAZ e regulamentados, via Decreto, em cada um dos Estados signatários. Desta forma, as empresas devem também levar em consideração a possibilidade deste benefício ser revogado a qualquer momento, e sem maiores dificuldades.

Sendo que, se ocorrer a revogação repentina, estes Convênios representarão uma verdadeira “armadilha”, que se pode explicar através do seguinte caso hipotético:

Uma empresa foi atraída pelo “benefício” de redução de base de cálculo, o que impactou diretamente no seu planejamento tributário, visto que não mais foi admitida qualquer separação de serviços. Após 06 (seis) meses de sua inclusão no referido benefício, o mesmo foi revogado.

E o que ocorreu? Esta empresa continuou a recolher o ICMS sobre a integralidade de suas receitas, mas agora sem qualquer benefício de redução de base de cálculo, o que majorou excessivamente sua carga tributária.

E qual alternativa adotada pela mesma para conseguir reduzir novamente sua carga tributária? A alternativa imediata adotada por esta empresa for retomar a separação dos serviços, o que criou uma verdadeira contradição entre o passado e futuro da referida empresa.

Portanto, como contextualizado acima, é fundamental uma análise acurada de cada um dos Convênios estabelecidos com o objetivo de redução de base de cálculo do ICMS sobre os serviços de comunicação (ou telecomunicações), pois ao contrário de uma solução para a redução da carga tributária, estes Convênios podem representar uma “armadilha”.

*Paulo Henrique da Silva Vitor

Advogado e Consultor Jurídico; sócio fundador da Silva Vitor, Faria & Ribeiro Advogados Associados

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