Obrigações regulatórias dos ISPs além da Anatel


Bárbara Castro Alves (*) 

Nem de longe as obrigações regulatórias de empresas que prestam Serviços de Comunicação Multimídia limitam-se à Anatel. Pela natureza do trabalho, que tanto demanda capacitação técnica quanto treinamento para atuação em condições que expõem profissionais a sérios riscos, empresas devem dispor de equipe devidamente capacitada e certificada para o exercício de diferentes funções inerentes à atividade. 

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ISPs de todos os portes são obrigados a disporem, para a instalação da infraestrutura necessária à atividade – cabeamento em postes, manutenção e montagem de redes e estações, dentre outros –, de profissionais treinados para atuarem próximos à rede de alta tensão e em alturas elevadas. 

Embora algumas PPPs terceirizem esses trabalhos junto a empresas especializadas, a maioria opta por dispor de equipes próprias para tal. Em qualquer dos casos, esse tipo de atuação só pode ser realizada por profissionais que disponham de certificação quanto às Normas Regulatórias (NR) 10 e 35. Emitidas pelo Ministério do Trabalho, atestam capacitação para atuação em determinadas condições de risco. 

A NR 10 refere-se à realização de trabalhos próximos à rede de alta tensão. Embora o cabeamento de telecomunicações não conduza eletricidade, sua instalação requer alguma aproximação da rede elétrica e, mesmo com o distanciamento de meio metro que deve separar as duas, a energia pode atrair o profissional resultando em uma descarga capaz de levá-lo à morte. Graves também podem ser as consequências de quedas de alturas superiores a 2 metros, tipo de atuação que só pode ser realizada por quem dispor da certificação NR 35. 

A obtenção de ambas demandas realização de cursos específicos. Além de poder resultar em acidentes graves ou até fatais, a realização de tais trabalhos por quem não dispõe destas certificações expõe as empresas a autuações e multas aplicadas pelo Ministério do Trabalho. Esta fiscalização observa também se as NRs vinculam os profissionais às empresas para as quais atuam em cada serviço. Não é permitido que um técnico instalador atue para uma PPP tendo suas certificações atreladas a outra. É comum também que contratantes que dispõem de políticas consolidadas de segurança no trabalho dispensem os serviços de ISPs que não possuem profissionais devidamente certificados para a instalação de infraestrutura. 

Se a terceirização de tais trabalhos dispensa provedores de terem equipes com certificações NR 10 e NR 35, todos são obrigados a terem um responsável técnico. A exigência de um profissional com este perfil parte sempre de um conselho técnico – CREA ou CFT -, sendo que o vínculo a, pelo menos, uma dessas entidades é condição para a oferta de serviços de comunicação multimídia. 

ISPs de menor porte optam geralmente pela inscrição no CFT que, além de dispor de taxas menores, exige um profissional de nível técnico, enquanto que o CREA demanda um engenheiro eletricista ou de telecomunicações. Por se tratar da prestação de serviço de comunicação multimídia, o responsável técnico pode ainda exercer suas funções remotamente. 

Anteriormente, a comprovação da indicação de um responsável técnico compunha o leque de exigências da Anatel para expedição da licença SCM. Embora não faça mais tal demanda, a agência mantém públicas as outorgas e autorizações por ela expedidas para ISPs. Desta forma, ambos os conselhos podem verificar os provedores que não dispõem de registro em seus cadastros ou no outro conselho. Este é um dos orientadores das fiscalizações realizadas por CREA e CFT. 

Além de provedores que atuam em total desrespeito à legislação – o que expõe seus sócios e gestores a penas de até quatro anos de detenção – parcela ainda significativa do mercado mantém atuação parcialmente irregular. Por exemplo, embora dispondo de autorização da Anatel para fornecer SCM, ignora as obrigações perante outros órgãos, caso de CREA e CFT. 

A ideia corrente dos infratores nestes casos é que, quando a fiscalização ocorrer, é chegada a hora de obter a devida regularização. Ocorre que isso pode sair demasiadamente caro. A partir dos dados disponibilizados publicamente pela Anatel, os conselhos podem aplicar multas retroativas a todo o período em que um ISP atuou sem vínculo obrigatório a um conselho sem dispor de um responsável técnico. 

Embora a filiação de um provedor a um dos órgãos desabilite a fiscalização do outro, a falta de qualquer vínculo desta natureza – falta de registro em ambos – possibilita aos dois expedirem autuações e multas. No caso do CREA, variam entre R$ 6 mil e R$ 7 mil. O órgão dispõe de fiscalização mais efetiva. Porém, a se julgar pelos recentes recrutamentos de profissionais para tal função, o CFT poderá, num futuro breve, ser o principal fiscalizador desse mercado. 

A Anatel tem atuado em diversas frentes para mapear oferta e demanda por banda larga no país. Boa parte deste trabalho tem como principal foco as PPPs, particularmente pela disponibilização de conexões por elas proporcionada na maior parte do território nacional, o que indica que serão essas empresas que impulsionarão tanto o 5G quanto as demais tecnologias necessárias à descentralização econômica acelerada pela Covid. É, no mínimo, ingênuo crer que apenas a agência volta suas atenções aos ISPs de menor porte. 

Há desde outros reguladores da atividade que controlam a prestação de serviços de comunicação multimídia a atuais consumidores, potenciais clientes e investidores olhando para o segmento. É um momento em que essas empresas podem tanto receber investimentos significativos quanto punições que inviabilizem suas atividades. Se o cumprimento de obrigações regulatórias não compõem o dia a dia de gestores e empresários do segmento, vale recorrer a consultorias especializadas para, ao invés de sucumbir à onda do momento, surfá-la. 


(*) Bárbara Castro Alves é gerente de Processos Regulatórios da VianaTel, empresa especializada na adequação legal de provedores de Internet e gerente financeira da RadiusNet, fornecedora de softwares de gestão para ISPs. 

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