Um novo quadro regulatório a partir do leilão do 5G


5G/Crédito: FreepikFabio Vianna Coelho (*)

O pontapé inicial para que o país pudesse sonhar com a adoção em massa de soluções como IoT, Inteligência Artificial, cirurgias à distância, smart cities e tudo o mais que o 5G possibilita, foi dado com leilão de frequência da tecnologia realizado pela Anatel no final de 2021. Porém, mesmo que os vencedores do leilão tenham metas a cumprir, as inovações possibilitadas pelo novo padrão de conexão só terão a escala desejada quando o quadro econômico, marcado por baixíssimo crescimento e elevada taxa de juros, mudar. Se a crise é hoje um obstáculo quase intransponível, há um esforço conjunto para se eliminar outros entraves, principalmente de ordem regulatória e legal, o que afeta diretamente os ISPs, mesmo os que não ofertarão tão cedo o 5G.

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Um deles refere-se à limitação do número de antenas de transmissão de dados que, no caso do 5G, demanda até dez vezes mais equipamentos que o 4G. Para que a proliferação desse tipo de infraestrutura se dê nos patamares necessários para viabilizar a tecnologia, municípios são convocados a aprovar leis que sigam o PL padrão que a Anatel sugere sobre o tema.

Se o número de antenas terá de ser ampliado para que o 5G funcione, haverá também mais desses equipamentos voltados ao 4G, que tem registrado crescimento substancial como parte das ofertas de PPPs que, em um mercado cada vez mais competitivo, buscam ampliar seus portfólios de serviços para conquistar ou fidelizar clientes. Conforme a Anatel, em julho, essas empresas registraram um crescimento de 7,4% na oferta de conexões 4G, ou 5,4 milhões de novas linhas.

Se novas leis auxiliam os ISPs a ampliar sua participação num mercado que até há pouco era restrito às grandes teles, isso também os aproximará dos agentes fiscalizadores dos municípios em que atuam.

Outro ponto nevrálgico da tecnologia é sua dependência da rede de fibra óptica, fundamental para que 5G – e mesmo o 4G – possa realizar a transmissão de volumes de dados e baixa latência prometidas. Exceto nos grandes centros, a maior parte dessa infraestrutura pertence aos ISPs.

Porém, enquanto os cabos de fibra dos PPPs – que, até agora, viabilizaram a maior parte da oferta de banda larga no território nacional –, passam a ser estratégicos para a implantação do 5G, as concessionárias de energia tentam elevar os valores cobrados pela utilização de seus postes. Caso notório ocorre no Ceará, onde ISPs, representados pela Abrint, pedem o fim da cobrança ou, pelo menos, seu adiamento até que Anatel e Aneel aprovem resolução conjunta sobre o tema.

Conseguindo ou não, as concessionárias – a Enel, em particular, que atua em São Paulo, Rio de Janeiro, Goiás e Ceará – redobrarão a atenção sobre a forma como atuam seus locatários, dentre os quais destacam-se os PPPs.

Também na esteira do volume de dados que a nova tecnologia 5G é capaz de transmitir, as grandes teles passam a pressionar a Anatel para que os mesmos padrões de cibesegurança delas exigidos sejam cobrados de alguns ISPs. Para tanto, argumentam que, se um ator falhar, todo o sistema será comprometido. Essa ação dos grandes sobre os pequenos não se limita à segurança, já que as operadoras também pedem o fim do tratamento diferenciado que os pequenos recebem da agência, o que vai desde a revisão da definição de PPP ao fim de uma tributação diferenciada.

Embora tais exigências sejam vistas com ressalvas pela Anatel, o questionamento sobre uma falta de isonomia regulatória no setor tem potencial para provocar a revisão de algumas práticas da agência para com os ISPs, o que aumentaria o grau de exigência – e a fiscalização – sobre estes em variados pontos.

Já as concessionárias de energia serão menos ou nada condescendentes ao observarem redes irregulares e não hesitarão em denunciar empresas que não tenham registros nos conselhos técnicos federais, como CREA e CFT, e cujos técnicos não disponham das devidas NRs, certificações obrigatórias para quem atua no ramo.

As ações aqui elencadas têm alcance nacional. Acabou, portanto, o tempo que os ISPs puderam ganhar mercado e receitas apenas atendendo à grande demanda por banda larga em localidades distantes dos grandes centros. O segmento cresceu e profissionalizou-se a ponto de incomodar as grandes teles. A falta de zelo com as obrigações regulatórias, legais e gerenciais significa hoje perder as condições necessárias para se sobreviver no mercado.


(*) Fabio Vianna Coelho é sócio da VianaTel e da RadiusNet, empresas especializadas em consultoria regulatória e software de gestão para provedores de Internet.

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