As dificuldades dos ISPs com a coleta semestral da Anatel


Crédito: DivulgçãoNathalia Paiva e Francielle Carvalho dos Santos (*)

A coleta semestral, um dos três modelos de relatórios que a Anatel exige dos ISPs e demais prestadores de serviços de telecomunicações, deve ser remetido até 31 de maio. Em sua terceira edição, o envio ocorrerá pela primeira vez no novo sistema da agência, que tem gerado dúvidas entre os que cumprem esse tipo de obrigação regulatória. Talvez por conta disso, o manual disponibilizado, desta vez, oriente mais sobre os procedimentos para preenchimento e formatação dos arquivos do que sobre a natureza das informações solicitadas.

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Até o último envio, a coleta era composta por dois arquivos – um para cada trimestre. Desta vez, passa a ser um só, onde devem ser inseridos dados relativos a receita líquida, Capex e tráfego registrados entre os meses de julho e dezembro de 2022. Por demandar menos informações que os relatórios mensal e anual, em tese, o semestral seria a mais simples dessas obrigações. Porém, nem por isso, deixa de gerar problemas aos provedores.

Parte deles se deve à natureza das informações solicitadas. Pouco familiarizados com termos financeiros e contábeis, muitos gestores comentem erros simples que impedem o processamento dos arquivos ou resultam em questionamentos posteriores da agência – problemas, geralmente, de difícil identificação e, por vezes, difíceis de resolver.

Isso ocorre, por exemplo, no preenchimento de campos sobre receita operacional líquida e Capex por pessoas que desconhecem os significados dos termos. Para os que não sabem do que se trata, uma simples busca no Google resolveria o problema de compreensão do conceito. No entanto, isso deixou de ser feito por muitos nas duas edições anteriores.

Também comum é a utilização de unidade de medida diferente da definida pela agência quanto ao tráfego de dados verificado no período. Muitas empresas os registravam em gigabytes, quando o correto sempre foi megabytes.

O cálculo do total de tráfego fornecido também costuma gerar problemas. Softwares de gestão, ferramenta necessária para a administração de carteiras que partem de algumas centenas de clientes e que a maioria dos ISPs dispõe, devem fornecer o dado. Quem não se vale desse tipo de solução tem de somar o tráfego a partir de cada um dos seus contratos que vigoravam nos terceiro e quarto trimestres de 2022, bem como as contratações de links realizadas no período. Nesses casos, geralmente, há discrepâncias com a realidade, que são suscetíveis a questionamentos posteriores da agência.

Falhas assim – consequências de desatenção, displicência ou dificuldades justificáveis – somam-se a outras que, para serem evitadas, demandam profissionais com algum conhecimento sobre formatação de arquivos e acesso às informações financeiras e contábeis, algo que nem sempre se relaciona com as atividades de um ISP. Há uma certa complexidade no preenchimento das coletas, o que dificulta seus envios e complica a vida de quem não é especialista.

A agência disponibiliza aos prestadores de serviços de telecomunicações por ela autorizados planilhas de Excel para o preenchimento dos dados desses relatórios. Embora seja um software conhecido da maioria das pessoas que atuam em administração, no caso do semestral, já nessa etapa, surgem problemas. Um deles é a necessidade de conversão do arquivo preenchido para o formato CSV (valores separados por vírgulas) com a codificação correta. Sem isso, o sistema da agência não o reconhece no momento da seleção. Ou seja, ainda que constem informações corretas, a transmissão é inviabilizada.

Resultem de falta de atenção ou de conhecimentos sobre informática, esses erros não são exibidos com clareza quando o sistema responde ao resultado do processamento dos arquivos. Dessa forma, solucionar a situação demanda uma série de tentativas até que surja a mensagem de que a operação foi realizada com êxito. E, mesmo depois disso, a agência pode questionar o provedor sobre as informações a ela remetidas, exigindo esclarecimentos ou retificação e reenvio do arquivo. Tarefas do tipo tomam tempo de trabalho, o que é custo para a empresa.

Como as demais coletas da Anatel, a semestral é composta por dados sobre a prestação de SCM, SeAC e SMP. SVAs, categoria que incorpora, dentre outros, VoIP e streaming de vídeo – ofertas muito comuns entre os provedores –, não figura na coleta quando caracterizados como serviços adicionais. Isso porque SVAs não são regulados pela agência. Portanto, as receitas deles resultantes não compõem coleta.

Nesta edição, há campos específicos para SMP, oferta que tem crescido a partir dos ISPS. Quem não dispõe do serviço de telefonia móvel deve enviar o arquivo com seus respectivos campos em branco. No caso de provedores que não registraram movimento no período – por exemplo, os que obtiveram autorização da agência, mas ainda não entraram em operação – os campos das planilhas relativos à operação devem seguir em branco. Mesmo nesses casos, o envio é obrigatório.

A falta ou o atraso no envio de coletas gera desde processos administrativos, advertências e multas ao cancelamento da autorização para prestação de serviços. No caso da coleta semestral, que concentra informações contábeis, as consequências podem incluir também ofícios de fiscalização tributária, que podem partir da Secretaria da Fazenda, da Receita Federal ou mesmo da Anatel.

Como são recentes, ainda é difícil saber se as coletas semestral e anual já geram atos fiscalizatórios. Isso porque raramente são reveladas as informações – e origem – que os motivam. Certo é que, para não ficar exposto às punições diretamente relacionadas ao não cumprimento das obrigações relativas a esses relatórios, ISPs devem, observando também seus prazos, fazê-lo de forma profissional, para não cometerem a imprudência de enviar dados contraditórios ao órgão que mais os fiscaliza.


(*) Nathalia Paiva e Francielle Carvalho dos Santos são especialistas em processos regulatórios da VianaTel, consultoria especializada na regularização de provedores de Internet.

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